terça-feira, 17 de julho de 2012

O Haiti é aqui

No último mês, veículos de comunicação divulgaram a seguinte notícia: "Brasil já gastou quase R$ 2 bilhões no Haiti". Quem lê a chamada logo se lembra das mazelas que aquele país passou e que ajudá-lo não passa de uma ação humanitária, uma vez que em 2010 um terremoto atingiu a região e deixou mais de 200 mil mortos, cerca de 860 desaparecidos e mais de 310 mil feridos. Não discordo da visão de ajudar ao próximo, mas estamos falando que o Brasil, um país com deficiências sérias em setores como saúde e educação, está ajudando outra nação.
Não é o ato em si que deve ser colocado em xeque, mas todo um contexto. A força demonstrada no projeto de reerguer esta nação poderia muito bem ser canalizada para resolver problemas internos de nosso país. Na verdade, o envolvimento do Brasil neste caso começou com uma operação emergencial de apenas seis meses, com um custo previsto de R$ 150 milhões, mas em junho a operação completou oito anos de duração com gastos de quase R$ 2 bilhões.
A operação militar do Brasil naquele país iniciou-se em 1º de junho de 2004 como parte do plano do governo na época para obter um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. O detalhe é que a manobra consumiu mais de seis vezes o que o governo federal gastou com a Força Nacional brasileira no período de 2006 a 2012. O valor total também equivale a cerca de dois anos de gastos com um dos principais programas de segurança desenvolvido pelo Ministério da Justiça, o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), que tem como objetivo o enfrentamento à criminalidade no país.
Mais de 16 mil militares brasileiros já estiveram no país desde 2004. Levantamentos mostram que grande parte do dinheiro gasto foi gasto com a modernização de equipamentos. Foram adquiridos veículos, explosivos, munições, armamentos, embarcações e equipamentos navais. Parte do valor é reembolsado pela ONU. Segundo o ministério, os gastos estimulam a indústria militar brasileira. Recentemente, nosso país também enviou 1,5 milhão de doses de vacina contra a poliomielite ao país caribenho. O objetivo era imunizar 2,5 milhões de crianças.
Chega a ser contraditório um país que possui Forças Armadas quase que sucateadas auxiliar outro país a adquirir algo que nem mesmo ele tem. Como se sabe por aqui se trabalha com poucos armamentos, além de aviões, blindados e navios, em grande parte, inutilizados. Segundo recentes informações, a situação é a seguinte: 132 dos 318 equipamentos da Marinha estão parados; dos 1.953 blindados do Exército, somente metade funciona. Já a Força Aérea tem disponíveis 85 dos seus 208 caças.
Além disso, também há a falta de investimentos nas polícias, como na PM, que trabalha no limite, com baixos salários, poucas e velhas viaturas, além de armamentos limitados. Não podemos esquecer também de problemas crônicos que o Brasil possui em áreas como saúde e educação, expostos diariamente pela imprensa.
Há que custos nosso país tem lutado para obter um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU? Será mesmo que é mais importante investir em países vizinhos do que investir na própria nação? Sabe-se que a cadeira permanente é a maior aspiração da diplomacia brasileira nos últimos anos, pois o órgão toma as mais importantes decisões sobre conflitos e diplomacia no mundo. Um exemplo disto foi a aprovação de uma intervenção militar na Líbia contra as forças de Muammar Gaddafi. Mas colocar esse como o principal objetivo de nosso país beira o desrespeito com a população que vem sofrendo em filas de hospitais ou com a violência das grandes cidades.
Há um ano também pudemos perceber a fragilidade de nossa Defesa Civil no drama da Região Serrana do Rio de Janeiro, onde quase mil pessoas morreram nos temporais que trouxeram desabamentos de encostas e soterramentos de casas. Em momentos como esse percebemos o quanto o Brasil precisa de investimentos em áreas básicas, mas fundamentais para o crescimento da nação. Antes de alçarmos voos mais altos, precisamos erigir nosso país sobre os direitos sociais que nossa própria Constituição determina como o direito à educação, à saúde, à alimentação, ao trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à previdência social, à proteção à maternidade e à infância, à assistência aos desamparados.  

*Gilmaci Santos é deputado estadual pelo PRB e líder da bancada na Assembleia.

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