segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

A indústria que não morre

A morte de um familiar é sempre um momento difícil e extremamente doloroso para todos, mas existem empresas que lucram muito com este momento de dor, criando taxas e cobranças abusivas nos serviços funerários exatamente no momento em que os familiares estão mais sensibilizados. Essas empresas muitas vezes deixam de lado a cortesia e a educação para cobrar de maneira insistente o pagamento dessas taxas injustas.
Em 12/1 faleceu em Cotia, após semanas de internação, o amigo Francisco Sales Simões Tinoco. Ele foi velado na cidade de Cotia e sepultado em Vargem Grande Paulista, cidade vizinha. A família que possuía um jazigo no cemitério Memorial Bosque da Paz, em Vargem Grande Paulista, esperava que a contratada disponibilizasse uma estrutura que ao menos não gerasse ainda mais dor a todos. Já não bastasse o momento traumático que a família passou, todos foram pegos de surpresa pela total falta de respeito da equipe do cemitério, que também prestou o serviço funerário. O filho afirmou que os funcionários pareciam comemorar a morte do senhor Francisco.
Além de oferecer um serviço com o valor superior ao do mercado, a empresa contratada cobrou abusivamente um valor de R$ 2.275 pela chamada “taxa de carência de serviço”, considero esta taxa abusiva, pois prejudica apenas o consumidor. A família pagou também R$ 2.170 de taxa de assistência funerária e R$ 550 na tanatopraxia - procedimento de preparação do cadáver. Acompanhei de perto todo o drama da família e foi revoltante ver a prestadora do serviço efetuar a cobrança durante o velório, exigindo que a família efetuasse o pagamento em, no máximo, três vezes, e questionando o tempo todo sobre quando e qual familiar pagaria o valor. Foram tantos os infortúnios que os familiares ficaram ainda mais desgastados com a situação.
Segundo o cemitério quem compra um jazigo tem carência de 60 dias para utilizá-lo, mas não tem nem mesmo o direito de escolher o local dele. A família adquiriu o jazigo em 4 de dezembro de 2015, por R$ 4.050, pagando o valor em 12 vezes, sendo que se alguém morrer em 60 dias a família paga a carência, além disso, os familiares não podem escolher o local do jazigo antes de 5 meses. Além de todas essas taxas, existe também uma taxa de seis semestrais de R$ 250. Aos filhos, a contratada entregou apenas um termo de adesão e, após ser questionada, não quis entregar uma cópia do contrato.
A morte tem mesmo gerado lucro para muitos, além de ter visto isso de perto, segundo especialistas, a indústria da morte cresceu com vigor e se mostrou imune até mesmo à crise que atingiu o país. Os planos funerários faturaram mais de R$ 4 bilhões apenas no ano passado. Em 2005 existiam 8.500 empresas prestadoras de serviços funerários no país, dados recentes mostram que esses números já ultrapassaram as 13.700 empresas. Os planos funerários ainda não são regulamentados e até por isso muitos jogam no lixo o direito do consumidor. É preciso regulamentar e verificar os abusos que essas empresas praticam.
Existe um projeto de lei federal que trata da regulamentação, o PL 50, de 2014, que foi aprovado pela Câmara dos Deputados em 2013 e que atualmente está em tramitação no Senado Federal. Regulamentar esse tipo de serviço já seria um bom começo, porque é absurda e até mesmo criminosa a maneira como essas instituições tratam a morte e a dor dos familiares.
Os planos funerários têm como público-alvo as classes C, D e E, composta geralmente por pessoas que não têm condições de pagar seguros de vida, assim, os planos funerários se tornaram a opção mais barata para quem não tem como arcar com uma despesa alta com seguro de vida. Já que os planos funerários são tão utilizados o mínimo que se espera é que haja estrutura para agir com rapidez e atendimento diferenciado aos familiares, atendimento que não provoque ainda mais dor a todos.
A família do senhor Tinoco ficou assustada com tamanha falta de respeito, pagou a multa exigida pela empresa, mas cabe salientar que o valor será objeto de ação reparatória. Irei acompanhar esse caso e a ação dessas empresas. Vamos lutar pela regulamentação desse serviço. Faço parte da Frente Parlamentar de Defesa do Consumidor da Assembleia Legislativa de São Paulo e irei levar essa situação aos parlamentares que a compõem. A morte dever ser tratada com dignidade e respeito e não de maneira criminosa e visando apenas o lucro.

*Gilmaci Santos é deputado estadual (PRB) e membro efetivo da Comissão de Constituição, Justiça e Redação.